A história, contada em romances populares ou filmes campeões de bilheteira, já é familiar para muita gente. Numa das conspirações mais bem-sucedidas da história, a Igreja Católica conseguiu ocultar a verdade sobre a vida amorosa de Jesus Cristo. Como qualquer bom judeu de sua época, o Nazareno teria sido casado, e a esposa dele seria ninguém menos do que Maria Madalena, sua discípula mais famosa e aquela que mais dinheiro doou à causa chegando a alimentar todos os discípulos dias a fio. Ele foi crucificado quando Madalena estava grávida, mas alegadamente a mulher de Jesus conseguiu escapar para o sul da França, onde deu à luz uma menina. O verdadeiro Santo Graal não seria, então, um cálice no qual foi recolhido o precioso sangue de Cristo, como dizem as lendas do rei Arthur, mas sim o ventre de Madalena. E os descendentes do casal virariam uma linhagem sagrada, dando origem a uma dinastia de reis da França medieval. Pistas disso estão espalhadas pelos Evangelhos apócrifos, que a Igreja suprimiu quando se tornou a instituição religiosa dominante do Império Romano… mas foram encontrados!
Fantástica história romanceada por Dan Brown, autor de O Código Da Vinci, que já facturou milhões ao investigar e desenvolver toda esta trama. Mas na Bíblia é diferente: Maria Madalena é basicamente uma seguidora de Jesus que testemunha a crucificação. Nada ali indica um relacionamento com Cristo – muito menos que ela fosse prostituta; essa é só uma lenda que pegou e deu imenso jeito ao catolicismo. Por outro lado, nos apócrifos, o retrato dela muda. Vários desses textos retratam Madalena como alguém que tinha uma posição especial entre os primeiros discípulos, uma mulher sábia que tinha um relacionamento próximo com o mestre e é mencionado várias vezes o suposto matrimónio, vida a dois e o ciúme exagerado de Pedro em relação a ela na preferência do Messias.
O primeiro exemplo interessante sobre o papel de Madalena está no Evangelho de Tomé, texto apócrifo, onde quem coloca a discípula no centro de discussão é o apóstolo Pedro, com uma frase que, no mundo moderno, certamente deixaria muita gente horrorizada pelo machismo embutido nela: “Simão Pedro disse a eles: ‘Maria tem de nos deixar, pois as mulheres não são dignas de viver”.
O Evangelho de Filipe fala de Madalena duas vezes. Na primeira, o evangelista menciona as várias “Marias” importantes para a biografia de Jesus. “Três mulheres sempre caminhavam com o Senhor: Maria, sua mãe, sua irmã [na verdade, em copta, o texto fala em “irmã dela”, mas parece ter sido um erro do copista], e Maria de Magdala, que é chamada de sua companheira. Pois Maria ”é o nome de sua irmã, de sua mãe e de sua companheira”, diz o texto.
A outra passagem do Evangelho de Filipe é mais comprida e traz mais informações, mas por outro lado é ainda mais misteriosa, a começar pelo fato de que o texto possui lacunas, que os tradutores costumam preencher com conjecturas. Essas lacunas estão indicadas na citação a seguir com colchetes, como é o costume entre os especialistas. Se a lacuna for maior do que uma ou duas palavras, é representada com reticências.
“A Sabedoria, que é chamada de estéril, é a mãe dos anjos. A companheira do [Salvador] é Maria de Magdala. O [Salvador amava-]a mais do que [todos] os discípulos, [e ele] a beijava com frequência na sua [boca]. Os outros [discípulos]… disseram a ele: ‘Por que a amas mais do que a todos nós?”.
Tanto que há a descobrir e contar sobre esta figura apaixonante e que a Igreja Católica fez questão de destruir para vilipendiar e demonizar as mulheres num todo… triste, mas real!